segunda-feira, 13 de julho de 2015

O médico que mentiu e levou à quimioterapia centenas que não tinham câncer

Em julgamento nos EUA, oncologista chamado de 'Doutor Morte' pode ser condenado a até 175 anos de prisão por fraude cometida contra pacientes.

Cartaz de testemunha traz foto do médico e de suas vítimas (Foto: AP Foto/Paul Sancya)

Nesta semana, dezenas de pessoas compareceram a um tribunal em Detroit, nos Estados Unidos, para testemunhar contra o médico Farid Fata, chamado por alguns de "Doutor Morte".

Elas chegaram ao local fragilizadas, apoiadas por bengalas, alguns com suas articulações enfaixadas e quase todas exaustas pelo desgaste físico e psicológico causado por anos de quimioterapia.

Ali, revelaram um fato aterrorizante: seu oncologista havia mentido para elas, que nunca haviam tido câncer.

Ao menos 553 pessoas se submeteram a este duplo sofrimento (dos efeitos colaterais do tratamento e o fato de acharem que tinham uma das doenças mais fatais do mundo) sem padecer deste mal, segundo a queixa criminal aberta pela polícia federal americana, o FBI, contra Fata.

Durante os testemunhos das vítimas, realizados nesta semana, Fata ficou sentado a três metros delas. Imóvel, escutava enquanto elas contavam sobre o que passaram.

'Você é um monstro'
"Mesmo que não esteja morta, sou uma sombra do que era", disse Maggie Dorsey, uma das pacientes. "Há dias em que não consigo nem ficar de pé."

Monica Flagg disse à emissora CBS estar furiosa: "Não posso crer que um médico tenha traído tanta gente desta forma".

O FBI afirma que Fata não apenas diagnosticou e tratou casos falsos de câncer como também prescrevia tratamentos caros e agressivos a pacientes que estavam em fase terminal e não teriam chances de sobreviver.

"Eu te odeio, Farid Fata", disse Laura Stedfeld ao médico em tom de voz elevado. "Você é repugnante. Você é um monstro. Evidentemente, é um covarde já que não consegue nem me olhar. Você me envenenou, me torturou e matou meu pai."

Alguns especialistas que testemunharam diante do juiz Paul D. Borman, na cidade de Detroit, disseram que o médico administrou uma substância chamada rituximab.

Ela deve ser aplicada no máximo oito vezes em linfomas agressivos, mas Fata chegou a aplicá-la 94 vezes em um paciente.

As motivações do médico eram claramente econômicas, segundo a denúncia da acusação. Entre 2007 e 2013, Fata apresentou faturas num total de US$ 225 milhões (R$ 725 milhões) ao Medicare, o sistema de seguro de saúde estatal dos Estados Unidos.

Esta fraude era feita por meio da sociedade Michigan Hematology Oncology, que dispunha de sete clínicas no Estado de Michigan.

Danos a pessoas saudáveis
A quimioterapia é um tratamento que permite destruir as células cancerosas que provocam metástase ou que tenham se espalhado pelo corpo. É administrada em ciclos que variam entre dias e meses.

Mas, como se trata de uma medicação agressiva, ela não afeta apenas as células doentes, mas também aquelas saudáveis. Por isso, pode causar problemas de saúde e deixar doentes pessoas que não tenham câncer, como foi o caso das vítimas de Fata.

Estes efeitos colaterais afetam de forma distinta a cada pessoa, de acordo com sua sensibilidade e estado de saúde.

Segundo a Sociedade Americana Contra o Câncer, as células sãs com probabilidades de serem prejudicadas pela quimioterapia são aquelas que produzem sangue na medula óssea, assim como as da boca, do trato digestivo, do sistema reprodutor e capilares.

Alguns medicamentos quimioterápicos podem gerar danos a células do coração, rins, bexiga, pulmões e sistema nervoso.

Outros tipos de quimioterapia causam efeitos colaterais a longo prazo, como infecções no coração ou danos aos nervos, assim como problemas de fertilidade.

A organização americana esclarece que a maioria dos efeitos desaparece lentamente após o fim do tratamento, mas adverte que "em certos, casos eles podem durar por toda a vida".

No julgamento, Fata declarou-se culpado de 16 acusações, entre elas conspiração, fraude e lavagem de dinheiro - e agora está sendo forçado a ouvir os testemunhos das pessoas cujas vidas arruinou antes de o juiz decretar sua sentença.

A promotoria demanda uma pena de prisão de 175 anos para o médico, enquanto seus advogados pedem que este tempo seja reduzido para 25 anos.


*Do G1