Cientistas identificaram um composto que consegue impedir que diversos tipos de câncer se espalhem pelo corpo, num processo conhecido como metástase. Em testes com animais, a substância, batizada metarrestin, reduziu o número de tumores e também deu uma maior sobrevida a eles, abrindo caminho para atacar o processo antes que as células cancerosas saiam do alcance de outras terapias.
— Muitas drogas têm como objetivo impedir o crescimento do câncer e matar as células cancerosas — conta Juan Marugan, líder da equipe de pesquisadores do Centro Nacional para Avanços das Ciências Translacionais dos EUA e um dos coautores da descoberta, relatada em artigo publicado nesta quarta-feira no periódico científico “Science Translational Medicine”. – Mas não há uma única droga aprovada que tenha como objetivo tratar as metástases. Nossos resultados mostram que a metarrestin é um agente muito promissor neste sentido e devemos continuar a investigar seu uso contra metástases.
Segundo os pesquisadores, em pacientes a metarrestin pode vir a ser uma terapia eficiente depois de cirurgias para remoção de tumores. Como cânceres muito desenvolvidos são difíceis de serem totalmente extirpados nas operações, os médicos geralmente também administram quimioterapias para tentar matar qualquer célula cancerosa que tenha sido deixada para trás e evitar que a doença ressurja. Assim, a metarrestin pode se somar a este protocolo de tratamento.
A metarrestin funciona ao destruir um componente ainda pouco compreendido das células cancerosas chamado “compartimento perinuclear” (PNC, na sigla em inglês). Os PNCs só são encontrados em células de câncer, e em maior número nas células de cânceres em estágio avançado, quando ele já começou a se espalhar para outras regiões do corpo.
Diante disso, Sui Huang e colegas da Universidade Northwestern, também nos EUA e uma das coautoras do estudo, já tinham demonstrado que quanto mais células cancerosas com PNCs num tumor, maiores as chances da doença se espalhar. Eles então sugeriram que reduzir o número de PNCs poderia se traduzir em uma menor progressão do câncer, com potenciais resultados benéficos para os pacientes. Assim, para testar essa ideia, Huang abordou Marugan, especialista na triagem, química e desenvolvimento de novos compostos, avaliando mais de 140 mil moléculas quanto ao seu potencial de eliminar os PNCs nas células de cânceres em estágio avançado.
E embora quase cem compostos tenham demonstrado algum efeito neste sentido, só um de fato destruiu os PNCs e células de câncer de próstata. Animados, eles se uniram a pesquisadores da Universidade do Kansas em Lawrence, ainda nos EUA, para modificar a molécula de forma que ela funcionasse ainda mais efetivamente, chegando à metarrestin, que se mostrou capaz de também bloquear a disseminação de células de câncer no pâncreas.
Por fim, em colaboração com Udo Rudloff, cientista do Centro de Pesquisas sobre Câncer do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, eles partiram para testar os efeitos do composto, inclusive sua toxicidade, em modelos de câncer no pâncreas em camundongos. Os experimentos comprovaram que a metarrestin evitou a metástase da doença ao interromper processos de fabricação de proteínas nas células cancerosas, com os animais tratados vivendo por muito mais tempo que os de controle, que não receberam a substância.
— As células de câncer se multiplicam rapidamente e precisam fabricar mais proteínas que as células saudáveis para realizar suas diversas atividades, inclusive a capacidade de se espalharem pelo corpo — explica Rudloff. — E ao interferirmos neste sistema, interrompemos as metástases.
Diante destes resultados promissores, os cientistas agora trabalham na obtenção de mais dados sobre o funcionamento da metarrestin em experimentos pré-clínicos de forma a torná-la uma real candidata a novo fármaco e conseguir autorização da Administração para Alimentos e Drogas dos EUA (FDA) para iniciar os testes com humanos.
*O Globo